Estado poderá dar um passo importante em direção à sustentabilidade ambiental
As usinas de etanol na Paraíba têm demonstrado interesse em utilizar o lodo de esgoto, ou biossólido, como fertilizante orgânico no cultivo da cana-de-açúcar, o que poderia gerar benefícios tanto ambientais, quanto econômicos. O composto obtido a partir do lodo tem demonstrado resultados promissores, além de possibilitar a redução da dependência de fertilizantes importados nas lavouras.
O Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool na Paraíba (Sindalcool-PB) destaca que essa iniciativa representa uma grande economia para as usinas e, ao mesmo tempo, contribui para evitar o descarte inadequado de resíduos sólidos na natureza.
“Os fertilizantes representam, em alguns casos, 20%, ou mais do custo de produção. Então, nessa hipótese, poderíamos estimar em R$ 300 milhões por ano as inversões necessárias para a produção no estado na área de cana-de-açúcar”, disse o presidente-executivo do Sindalcool-PB, Edmundo Barbosa.
De acordo com o executivo, na cana, são usados fertilizantes minerais como rocha fosfática, enxofre, calcário e micronutrientes como o magnésio e cobre, que são aplicados em doses indicadas pela análise de solo.
Há também o uso de orgânicos como o Microgeo e os da Koppert, que são pacotes de microorganismos para dissolver em água. Eles são incorporados ao solo em grandes quantidades, de três a quatro toneladas por hectare, ou mais.
“Em geral, os orgânicos têm custo menor de aquisição e custos maiores de aplicação. Para empresas ou produtores que estão certificados no RenovaBio, quanto mais orgânicos melhor porque a nota ambiental será melhor e haverá maior volume de CBIOs gerados. Os orgânicos são a riqueza do solo porque retém água e nutrientes para as plantas”, destacou Barbosa.
Como acontece o processo de transformação do biossólido em fertilizante orgânico
O processo de tratamento de esgoto gera o biossólido, que contém cerca de 85% de água, 20% de matéria orgânica e minerais, incluindo nutrientes essenciais para o crescimento das plantas, como cálcio, potássio e nitrogênio. No entanto, também contém materiais pesados, o que requer um processo de neutralização para torná-lo apropriado como fertilizante.
Para citar um exemplo prático, no ano 2000, a Cia Saneamento de Jundiaí, concessionária privada responsável pelo tratamento de esgotos na cidade, começou o projeto de tratamento e reciclagem do lodo de esgoto na agricultura. A partir de 2003, este mesmo trabalho foi terceirizado para a empresa Tera Ambiental LTDA, responsável atual por toda a operação de tratamento do lodo desaguado da Cia Saneamento Jundiaí e pela produção e comercialização do fertilizante orgânico, composto oriundo deste tratamento.
O caso de Jundiaí, inclusive, foi tema de reportagem do programa “Globo Rural”, da TV Globo, exibido em 21/11/21, no qual cerca de 50 toneladas de lodo eram tratadas diariamente, sendo misturadas a outros resíduos, como restos da indústria de chá, ração, calcário, cama de frango e até fábrica de batata frita.
O composto resultante passava por um processo de peneiração, gerando aproximadamente 3.500 toneladas de fertilizante por mês, comercializadas a um preço acessível de R$ 130,00 por tonelada (valores da época da reportagem).
A grande vantagem desse fertilizante orgânico é sua riqueza em microorganismos e diversidade, que enriquecem o solo, proporcionando uma economia considerável em relação ao uso de fertilizantes químicos, sendo que cerca de 70% dos fertilizantes do mercado atualmente são importados.
O doutor Fernando Carvalho Oliveira, engenheiro agrônomo, idealizador e responsável técnico direto pela implantação do projeto de tratamento e reciclagem do lodo de esgoto na agricultura, conta como esse negócio evoluiu no estado de São Paulo e chega a produzir e comercializar 38 mil toneladas anuais de fertilizantes.
“Houve uma evolução dos negócios em sintonia com a evolução do marco regulatório vigente no Brasil e no estado de São Paulo. Hoje, atuamos como uma indústria de fertilizantes orgânicos e organominerais e processamos o lodo de esgoto como uma matéria-prima. Atualmente, a Tera Ambiental Ltda processa, em média, 7.500 t mensais de lodos desaguados através do processo de compostagem termofílica, produzindo e comercializando cerca de 38 mil toneladas anuais de fertilizantes. As principais culturas compradoras do produto são: cana-de-açúcar, café, citros, frutíferas de clima temperado (como uva, pêssego, caqui), hortaliças, parques, jardins e plantas ornamentais”, afirmou Fernando, que é o responsável técnico da Tera Nutrição Ambiental desde agosto de 2000.



Lodo ainda não é usado na Paraíba, mas realidade pode mudar
As usinas de etanol da Paraíba já iniciaram conversas com a Cagepa para analisar a viabilidade dessa iniciativa. Contudo, descobriu-se que o volume de lodo na lagoa de decantação do Roger é relativamente pequeno e apresenta uma elevada proporção de areia, o que requer a realização de análises adequadas.
O presidente-executivo do Sindalcool-PB recomendou que essas análises sejam conduzidas pelo Instituto Agronômico de Campinas, seguindo os requisitos do CONAMA, o Conselho Nacional de Meio Ambiente.
“Estou acompanhando com interesse o sucesso desse projeto comum entre as duas instituições. A experiência com a decomposição de material orgânico ou compostagem já é utilizada na agricultura da cana na Paraíba em algumas empresas com excelentes resultados práticos no vigor da cana”, disse Edmundo.
No entanto, é importante ressaltar que para que o biossólido seja transformado em fertilizante orgânico, é necessário que empresas como a Cagepa implementem um processo semelhante ao utilizado na empresa de saneamento em Jundiaí, além de atender aos padrões exigidos pelo Ministério da Agricultura.
Com isso, a Paraíba poderá dar um passo importante em direção à sustentabilidade ambiental.
